Ficar em casa para cuidar dos filhos ou trabalhar: o dilema de muitas famílias nos EUA
Para Maggie Ficco, uma mãe trabalhadora no estado da Pensilvânia, a falta de vagas em jardins de infância e seus preços elevados são mais do que uma questão da campanha eleitoral nos Estados Unidos: são uma fonte de constante estresse e problemas financeiros.
"O preço do jardim de infância é praticamente igual ao pagamento da hipoteca de nossa casa", entre US$ 1.100 e US$ 1.200 (R$ 6.220 na cotação atual) por mês, explica esta educadora de 31 anos, em uma das pequenas casas de um bairro residencial perto da Filadélfia (nordeste).
"Ganhamos 'demais' para receber ajuda, mas se um de nós parar de trabalhar não conseguiremos pagar nossas contas. Eu sabia que seria um desafio, mas, honestamente, não imaginei que seria tão difícil", diz ela com seu bebê nos braços.
Decepcionada com a política, Ficco conta que ainda não sabe se votará no republicano Donald Trump ou na democrata Kamala Harris nas eleições de 5 de novembro. Ela gostaria que eles "realmente" se comprometessem com a questão da educação infantil.
"Tenho 31 anos e muitas pessoas que conheço decidiram não ter filhos por esse motivo (...) muitos de nós estão exaustos", afirma.
A educação infantil preocupa muitas famílias americanas e seus impactos no emprego e na renda são oficialmente reconhecidos.
Para a Câmara de Comércio dos EUA, esta "barreira é parte da razão pela qual os Estados Unidos têm mais de seis milhões de desempregados e 1,6 milhão de trabalhadores precários".
"Os pais pagam mais do que deveriam, mas isso não cobre nossos custos reais", conta Margie Sebastiani, diretora da creche frequentada pela filha de Ficco.
Sebastiani está tendo dificuldades para contratar novos funcionários porque os salários são muito baixos. Como resultado, duas em cada 10 salas de aula são fechadas por falta de pessoal e muitas candidaturas têm de ser rejeitadas.
Durante a pandemia de covid-19, a administração de Joe Biden injetou US$ 24 bilhões (quase R$ 136 bilhões) em ajuda a estes centros, "mas isso acabou enquanto os nossos custos aumentavam", lamenta a diretora.
"Sem a ajuda do governo federal ou estadual (da Pensilvânia), muitos estabelecimentos serão fechados", alerta, enquanto o número de centros licenciados pelo Estado caiu de 7.000 para 6.400 desde janeiro de 2020.
- "Escolher" -
Apesar das ajudas às famílias de baixa renda, "vemos pais com dificuldades reais", acrescenta Leslie Spina, diretora de uma rede de cinco creches em um bairro operário da Filadélfia.
"Eles não podem pagar o restante das despesas porque têm que escolher entre a medicação para asma dos filhos, a alimentação ou a creche", diz ela.
Em um dos centros, as listas de espera têm o dobro de sua capacidade.
April Washington, que trabalha como administradora em uma universidade, conta que esperou quase 18 meses por uma vaga para sua filha de três anos.
"Os preços dispararam. É estressante. Isso coloca você em uma espécie de competição com as famílias", lamenta.
Esta questão entrou no programa eleitoral dos candidatos presidenciais. A meta de Harris é reduzir o custo dos cuidados infantis para 7% do orçamento familiar, quando em grande parte do país ultrapassa 10% ou mesmo 20%.
Mas, além de prometer um crédito fiscal de US$ 6 mil (quase R$ 34 mil) para pais jovens, a democrata não detalhou seu plano.
Trump conta com os "bilhões de dólares" que seus impostos sobre as importações trarão. Seu companheiro de chapa, J.D. Vance, foi criticado quando sugeriu que "talvez os avós gostariam de ajudar um pouco mais". Também propôs aumentar um crédito fiscal existente.
"Eles oferecem créditos fiscais, mas não explicam como vão (aumentar) a oferta de vagas. Quem oferece este serviço precisa de financiamento", ressalta Carol Austin, diretora de uma associação de apoio ao setor First Up.
"Precisamos de ajuda", acrescenta Sebastiani, que tem a impressão de que "o ideal de quem controla o dinheiro é que os pais fiquem em casa com os filhos", mas "isso não é a realidade", conclui.
V.Duran--ESF