Trégua em Gaza é um acordo frágil com muitas incógnitas, alertam especialistas
A trégua entre Israel e o Hamás que entrou em vigor no domingo (19) na Faixa de Gaza é um acordo frágil, com muitas icógnitas e que pode entrar em colapso a qualquer momento, advertem os especialistas consultados pela AFP.
O objetivo do acordo de cessar fogo anunciado pelos países mediadores (Catar, Egito e Estados Unidos) é o "fim definitivo" das hostiliades, após 15 meses de uma devastadora guerra no território palestino.
No entanto, na segunda-feira, o novo presidente dos EUA, Donald Trump, disse que “não tinha certeza” de que a trégua seria mantida e, na terça-feira, o primeiro-ministro do Catar pediu a Israel e ao Hamas que demonstrassem “boa fé” na implementação de uma paz duradoura no território palestino.
O acordo prevê o fim das hostilidades para uma primeira fase de seis semanas, na qual 33 reféns israelenses devem ser libertados em troca de 1.900 prisioneiros palestinos.
Porém, após esse estágio, não há certeza. A segunda fase, que em teoria deve levar ao fim definitivo da guerra e à libertação de todos os reféns em troca da retirada completa das tropas israelenses de Gaza, será negociada nas próximas seis semanas.
“Há um grande risco de que a trégua seja interrompida“e que o primeiro-ministro israelense Benjamin Netanyahu retome a sua campanha militar em Gaza”, disse Anna Jacobs, do Instituto dos Estados Árabes do Golfo, à AFP.
“Netanyahu não alcançou nenhum de seus objetivos estratégicos nessa guerra, em especial a eliminação do Hamas”, o que corre o risco de levá-lo a "encontrar um pretexto para sabotar a trégua e continuar a guerra", explica.
Além disso, parece improvável que o Hamas aceite as exigências de desarmamento de Israel. Ao mesmo tempo, o movimento islâmico palestino está exigindo o fim do bloqueio de Gaza, que Israel se recusa a suspender há 17 anos.
- "Pressão constante" -
A “pressão constante” dos mediadores e “em especial de Donald Trump” será essencial para “preservar as fases restantes” dessa “frágil trégua que não põe fim ao conflito”, escreve Sanam Vakil, da Chatham House.
A guerra foi desencadeada em 7 de outubro de 2023 por um ataque sem precedentes do Hamas ao território israelense que deixou 1.210 pessoas mortas, a maioria civis, de acordo com uma contagem da AFP baseada em dados oficiais.
Das 251 pessoas sequestradas naquele dia, 91 ainda estão sendo mantidas como reféns em Gaza e 34 delas foram mortas, de acordo com o exército.
Em retaliação, Israel lançou uma ofensiva devastadora na Faixa de Gaza sitiada, que deixou pelo menos 47.107 pessoas mortas, a maioria civis, de acordo com dados do Ministério da Saúde do Hamas considerados confiáveis pela ONU, e causou um desastre humanitário.
Colin Clarke, do Soufan Center, acredita que “no curto prazo, a trégua pode durar porque os dois lados precisam de um tempo para respirar”.
A diplomacia do Catar garante que os mediadores no Cairo têm observado o bom funcionamento da trégua e “monitoram diariamente” as operações de troca de reféns por prisioneiros, as comunicações entre Israel e o Hamas, a retirada do exército israelense, o retorno das pessoas deslocadas e a reabertura de infraestruturas essenciais, como hospitais e padarias.
Desde o primeiro dia, a trégua mostrou sua fragilidade e entrou em vigor com três horas de atraso porque o Hamas se atrasou em fornecer a lista dos três reféns que seriam libertados naquele dia.
Durante essas três horas, os ataques israelenses deixaram oito palestinos mortos, segundo a Defesa Civil em Gaza. E Israel terminou liberando os prisioneiros palestinos mais tarde que o previsto.
"A pergunta que surge é se Netanyahu seguirá respeitando a trégua depois da libertação dos reféns", disse Husein Haridi, ex-vice-ministro egípcio das Relações Exteriores. E Clarke adverte que se a longo prazo exista "um plano viável para um Estado palestino" é possível que se instaurem novos conflitos.
L.M. Del Campo--ESF